terça-feira, 13 de maio de 2008

Caderno -

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Os dias têm passado como o vento passa. Vêm uns raios de sol e depois umas gotinhas de chuva, mas passa tudo com o vento e com o tempo. Amanhece e anoitece num estalar de dedos, as nuvens choram e voam para outro lugar, e eu? Eu fico sentada à minha secretária a observar o mundo de fora da minha janela. E suspiro. Pego naquele meu caderno cor-de-rosa e folheio-o. Abro o meu estojo e retiro uma caneta, ja a ansiar o momento em que te vou contar como foi o meu dia e como estou, se melhor ou pior, se com mais ou menos saudades. E depois olho novamente para fora da janela e olho para a imensidão de espaço que existe sem ninguem, onde tu poderias estar perfeitamente, mas não estás. Olho ainda para o ceu e penso que estou a olhar para o mesmo ceu que te cobre. Chego até a pensar que tudo o que me rodeia tambem rodeia tanta gente e isso só me faz perguntar porque serei a única assim como sou, a fazer o que faço, a pensar nas coisas que penso, a amar-te verdadeiramente. Suspiro novamente e concluo que nao serei a única. É impossivel ser a única assim. Tiro a tampa da caneta, abro o caderno numa folha em branco, anuncio a data. E começo a escrever. Vejo os ponteiros do relogio a movimentarem-se, mas prefiro nao dar conta do tempo a passar. Estou a dedicar tempo a ti e para mim isso é mais importante que propriamente qualquer outra coisa. Tu. Tu. Tu. Mas também eu, porque escrevo para ti em meu nome, escrevo-te porque preciso disso. Eu. Eu. Eu. Queria nós. Mas isso não há. Quando acabo de escrever, tapo a caneta, arrumo-a no estojo e releio tudo aquilo que escrevi. Deixo o caderno estar como está, deito uma lágrima ou outra e volto a olhar para fora da janela a ansiar encontrar um outro mundo, uma outra paisagem, uma outra realidade, e deparo-me com o mesmo, está tudo igual e não há nada que eu possa fazer. Fecho o caderno e deixo o estar em cima da minha secretária porque sei que passado umas horas vou voltar a abri-lo com a mesma paixao, com o mesmo carinho e amor, com a mesma amizade, com a mesma saudade e vontade. Fica tudo igual tal como a vista da minha janela. Mas o tempo passa. E isso é que é o mais estranho, parece que fica tudo igual enquanto ha tanto que se faz para que as coisas mudem... E elas simplesmente estancam. O sentimento permanece, prolonga-se, eterna-se. E entretanto chega o futuro, e o presente passa a ser passado, e depois? Está tudo como eu queria que estivesse? Por vezes penso que talvez nao valha a pena o sonho. Sonhar sonhar sonhar com maravilhas, maravilhas impossiveis. Alimentar-nos com esperanças, com memorias que desejamos voltar a viver, com sonhos que pensamos que somos capazes de tornar em realidade e objectivos que pensamos que nos tornarão felizes. Desço levemente à terra e espero que haja um amortecedor. Está na hora de descer. O ponteiro do relógio chegou à hora. Já deu a badalada. Está na hora. Desço. Páro. Olho à minha volta. Respiro o ar maravilhoso que esta nova realidade me trás. Encontro a estrada que sempre procurei. E caminho. Caminho com uma mochila que leva a vontade, o esforço, a dedicação, o trabalho, a amizade, o amor, o carinho, as memorias, o valor, a força, a luta, lá dentro, para que me acompanhem no meu percurso e me ajudem sempre que eu entender. E levo os cadernos.
O caderno cor-de-rosa passa a ser um azul ou um verde ou um branco, ou um de qualquer outra cor, e terá folhas preenchidas com palavras dirigidas a outra pessoa que nao tu, porque a vida trata-se de um ciclo, de fases que nos acompanham e nos traçam mas que vão e apenas ficam como memórias, e que apenas emanem saudade. Tudo se volta a repetir, com particularidades diferentes, pormenores que mudam, mas tudo incrivelmente igual. Mas é uma nova oportunidade. E é por isso que é necessário esta repetição, para que possamos todos ter mais que uma oportunidade, para que possamos todos viver coisas inumeras vezes com a possibilidade de repetir algo que gostámos, mudar algo que nao gostámos, inovar e fazer algo que sempre quisemos fazer mas que nunca tivemos a oportunidade para o fazer. É uma chance. E estes cadernos representam isso. Desejos, suspiros, amores, amizades. Vida. Representam sentimentos. E são meras palavras.
Todos temos os nossos cadernos. Faz um para um alguem, dá um a um alguem. E guarda o teu. Guarda o teu.
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